Com a economia sendo um fator-chave nas eleições alemãs deste mês, será que o setor automotivo pode voltar à trajetória de recuperação?
emissões compulsórias na força de trabalho alemã sejam altamente improváveis, já que um acordo trabalhista as invalida até 2030. Enquanto isso, a Ford, que opera duas fábricas na Alemanha, anunciou recentemente planos para cortar 2,8 mil empregos no país.
Nem todos os problemas do setor automotivo alemão estão restritos à própria Alemanha. Com o mercado europeu saturado, os fabricantes do continente têm buscado crescimento em outros lugares há várias décadas.
O impacto da China
Um dos mercados mais lucrativos tem sido a China, onde, por algum tempo, a crescente classe média teve um apetite aparentemente insaciável por veículos europeus de luxo. A VW, a Mercedes-Benz e a BMW se uniram a empresas locais, montando fábricas na própria China para atender à demanda local.
Mas agora essa fonte de crescimento está secando. Todas as “três grandes” montadoras registraram queda nas vendas recentemente — em 2023, as vendas da VW na China despencaram 9,5% em relação ao ano anterior; as da Mercedes-Benz caíram 7%; e as da BMW, 13,4%. Sua participação combinada no mercado chinês também diminuiu para 18,7%, contra um pico de 26,2% em 2019. Isso parece ser o resultado de uma economia chinesa em desaceleração, da queda do interesse em carros caros de marcas estrangeiras e do rápido crescimento das marcas locais, especialmente no mercado de carros elétricos.
“Não faz muito tempo, as marcas ocidentais representavam qualidade e confiança”, explica Mark Rainford, fundador do site Inside China Auto. Mas, segundo ele, desde então, a reputação e o apelo das marcas chinesas melhoraram muito.
Todas as “três grandes” montadoras dizem que as tendências na China tiveram um impacto significativo sobre seus ganhos.

As marcas chinesas também estão tentando conquistar uma fatia do mercado europeu, ajudadas por seus custos operacionais muito mais baixos do que os dos rivais mais estabelecidos, tanto porque os salários são mais baixos na China, quanto porque, como empresas apenas de veículos elétricos, elas não têm os mesmos custos herdados das fabricantes que estão fazendo a transição de carros a gasolina e diesel para carros movidos a bateria.
De acordo com a Comissão Europeia, as marcas chinesas também se beneficiam de grandes subsídios governamentais, o que permite a elas vender carros a preços anormalmente baixos. Em outubro, a União Europeia introduziu tarifas extras sobre as importações de veículos elétricos fabricados na China, em um esforço para criar igualdade de condições.
Guerras comerciais?
As empresas alemãs se opuseram às tarifas da União Europeia, pois temiam que a retaliação da China pudesse afetar suas próprias exportações. Agora, elas também enfrentam a ameaça de novas medidas protecionistas que estão sendo introduzidas pelo governo Trump, incluindo possíveis tarifas sobre carros enviados da União Europeia. Para um setor que depende muito das exportações, o aumento do protecionismo é uma ameaça crescente.
“Sabemos que as guerras comerciais só criam perdedores em ambos os lados. As tarifas vão custar riqueza, crescimento e empregos”, diz Simon Schütz, da VDA.
Embora algumas das pressões enfrentadas pelas empresas automotivas alemãs não fossem previsíveis, ainda havia um elemento de complacência, acredita o analista Matthias Schmidt. “Elas sabiam que os problemas estruturais existiam, mas foram ofuscados pelo gás russo barato”, diz ele.

“A expansão para a China e os altos lucros enviados de volta para a Europa mascararam as questões dos altos custos de mão de obra, deixando os sindicatos com uma carta coringa na manga.”
“A Alemanha tem sido efetivamente um mercado voltado para a exportação e, quando esses mercados espirram, a Alemanha pega um resfriado, e foi isso que aconteceu.”
Um desafio de alto risco
Será que as montadoras de automóveis da Alemanha vão conseguir recuperar sua sorte? Esta é uma questão vital para as fabricantes, para suas redes de fornecedores e para o país como um todo.
“O problema da Alemanha é que não somos competitivos”, diz Ferdinand Dudenhöffer, diretor do Centro de Pesquisa Automotiva, com sede em Bochum.
“Não apenas em termos de custo, mas também em termos das novas tecnologias que vão reger o mundo no futuro.”
Ele acredita que a China se tornou o centro de gravidade para inovação em áreas como transformação digital e tecnologia de baterias.
“A solução para as montadoras e para os fornecedores, na minha opinião, vai ser levar suas fábricas para o exterior”, ele avalia.
Simon Schütz é mais otimista. Ele acredita que o setor pode prosperar, mas somente se obtiver o apoio necessário do governo após as eleições no fim deste mês.
“Nosso setor automotivo vai ser líder mundial, tenho certeza disso”, ele afirma.
“A questão é: onde vão estar os futuros empregos? Eles vão ficar na Alemanha, porque podemos construir carros aqui, ou nossas empresas vão para outro lugar?”
Mas, para o representante do sindicato Steffen Schmidt, a solução é voltar aos valores industriais tradicionais da Alemanha.
“Temos que nos tornar novamente líderes em inovação e tecnologia”, diz ele.
“Assim, poderemos manter altos salários e boas condições para os trabalhadores.”
Na visão dele, o caminho que o novo governo tem pela frente é muito claro: “Investir, investir, investir. Em infraestrutura, em tecnologia, em energia verde e em educação”.
Para dezenas de milhares de trabalhadores em Wolfsburg e em outras “cidades automobilísticas” da Alemanha, como Ingolstadt, Weissach, Munique, Stuttgart e Zwickau, os riscos não poderiam ser mais altos.
Fonte: Correio Braziliense
Foto: Getty Images